Ensaio sobre a cura de relacionamentos

13/03/2019 00:00

"Intencione aquilo que o conecte à sua verdade, sobre a qual você consiga repousar por toda a eternidade."

 

Como eu serei lembrado quando só as minhas ideias forem lembradas? É comum sermos mal interpretados em nossas atitudes quando não deixamos claro, ou cometemos o erro de não querer demonstrar, para as pessoas, a nossa real intenção ao praticá-las. Curar um relacionamento com alguém é conseguir fazer com que esse alguém compreenda o que você de fato pretende alcançar por meio da interação entre vocês. Logo, quanto mais consciência temos do que desejamos em cada aventura relacional que empreendemos, maior a nossa possibilidade de curar relacionamentos. A intenção é mais importante que a ação. Recentemente, curei meu relacionamento com minha mãe por meio de um "não" a uma atitude 'de amor'. Ela compreendeu qual era a minha vontade/necessidade naquele momento.

 

O desejo de reciprocidade é intrínseco a todo relacionamento. Todos, ao nos relacionarmos, queremos amar e ser amados. Por isso, se um dia as atitudes de ambos nos fizerem duvidar da intenção de um para com o outro, teremos de nos curar: relembrarmo-nos, mutuamente, o que pretendemos. Todo encontro é uma oportunidade de cura(r)(-se). Cura do outro (mostrá-lo sua intenção). Curar o relacionamento (ajustar os interesses de cada um entre si). Curar-se (buscar saber do outro qual é o real propósito daquela pessoa em relação a você).

 

Encontros, no sentido aqui empregado, são privilégios de pessoas vivas e interessadas na cura. O Josias, a quem dedico amor de pai, falecera em 26.03.2014. Até esse traumático dia, nosso relacionamento estava curado. Ele sabia que eu o amava/amo como pai. Eu tinha/tenho certeza de que ele me amou como filho. Ambos compartilhamos a reciprocidade. Essa é a nossa verdade, sobre a qual repousaremos por toda a eternidade.

 

Há, talvez, centenas de pessoas que precisem 'se curar de mim'. Ou seja, que precisem saber de mim qual é o meu real interesse em relação a elas. Que a vida terrena me conceda a graça de conseguir curar o máximo de relacionamentos possível. E se eu não curar algum, que tod@s saibam que eu só queria amar e ser amado...

 

Esse texto tem o objetivo de curar seis relacionamentos em específico. Hoje, 13.03.2019, que à essa altura já é ontem, faz um ano do, até então, segundo dia mais traumático de minha vida: o do meu divórcio. Eu queria poder falar-lhes, enquanto vivos, da minha real intenção ao casar. Mas como encontros são para vivos e interessados na cura, e vocês sumiram; segue na forma de monólogo, de ensaio, de prosa livre que versa sobre a cura de meu relacionamento com vocês, sem esgotar as possibilidades de diálogo, feita com verdade e em profundidade.

 

As intenções não me eram claras e eu não me dei o tempo suficiente para refletir sobre elas na época em que tudo aconteceu. Quando a pedi em namoro no primeiro dia em que nos conhecemos, eu precisava viver minha primeira experiência de ‘reciprocidade homem-mulher’. Quando eu incentivava os estudos e trabalho, eu queria a reciprocidade intelectual e de sobrevivência. Quando eu terminei o namoro depois que você me disse que não faria o ENEM, é porque eu sabia que meu propósito era ter alguém que se esforçasse ao meu lado. E se eu voltei a namorar com você, foi porque acreditei que você poderia até não se esforçar nos estudos, mas que iria se esforçar em outras áreas da vida.

 

Quando eu casei e me esforcei para ajudá-la a pagar suas dívidas antigas, eu sabia que era o correto a fazer, e disso não me arrependo. Quando aluguei apartamento perto do trabalho e de igrejas católicas foi pensando no seu bem-estar e segurança. Quando eu perguntava se estava tudo bem com você e dizia-lhe que estava apertado financeiramente, eu precisava saber a sua verdade e precisava da sua ajuda. Quando eu a traí com uma bela mulata, de cujo nome não me lembro, foi porque ela me proporcionou o que eu precisava: sentir-me desejado, acompanhado por alguém; e quando a contei e entreguei a aliança, logo que cheguei em casa, eu só queria saber qual era sua intenção. Quando você esbravejou, eu entendi e respeitei...

 

Quando você ‘me perdoou’, eu acreditei que sua verdade viria à tona. Não veio. Agora a minha intenção já era divorciar. Você relutou, eu não ‘titubeei’. Decidi. Quando eu propus e expliquei o porquê da substituição da pensão que você pediria, eu sabia que era o justo. Quando fui à rodoviária buscar a Certidão averbada com o divórcio, tive certeza de que era o fim, e de que eu havia sido autêntico comigo mesmo em todas atitudes narradas, e nas não narradas, desde o dia que a vi pela primeira até o dia que a vi pela última vez...

 

Sobre os outros cinco relacionamentos, o processo de cura é mais simples: eu só queria poder amar e ser amado na condição de sogro/genro, sogra/genro, cunhada/cunhado, cunhado/cunhado e concunhado/concunhado. E assim eu sei que fiz. A cura, no caso de vocês, é fazê-los compreender que tudo o que fiz, enquanto nos papeis de genro, cunhado e concunhado foi verdadeiro. E de vocês carrego uma certeza maior de que tive reciprocidade.

 

Amo essas seis pessoas, agora na condição de seres humanos. A intenção em relação a tod@s é de poder conversar. Se me amam e em que condições, eu não sei, embora quisesse (saber se sabem das minhas intenções). Se um dia o interesse nascer no coração de um, dois, três ou até dos seis, há de haver um, dois, três ou vários encontros para que se curem também...

 

E se um dia só as minhas ideias forem lembradas, que eu seja lembrado pelas boas intenções das quais se diz que o céu está cheio. Hoje, e de agora em diante, ficarei atento para que minhas atitudes revelem ao máximo minhas intenções e, se não revelarem, que eu diga quais são. Março: meu mês de cura.

 

Raul Roland